segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Documentos base para elaboração do Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos de São Paulo (1)


EDUCAÇÃO POPULAR E EDUCAÇÃO AO LONGO DA VIDA. Moacir Gadotti. São Paulo, janeiro de 2016. 

MARCO DE REFERÊNCIA DA EDUCAÇÃO POPULAR PARA AS POLÍTICAS PÚBLICAS. Brasília: Secretaria-Geral da Presidência da República, 2014.

PÁTRIA EDUCADORA. Moacir Gadotti. São Paulo, agosto de 2015.

PLANO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS DA BAHIA. Bahia: Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, 2009.

DOCUMENTO PARA PLANO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS DO PARANÁ. Curitiba: Secretaria de Estado da Educação; Conselho Estadual de Educação do Paraná, 2015.

PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS – PMEDH – DE SÃO PAULO. São Paulo: dezembro de 2016.

PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007.

QUANDO A PEDAGOGIA TORNOU-SE “DO OPRIMIDO” QUANDO A EDUCAÇÃO TORNOU-SE “POPULAR”. Carlos Rodrigues Brandão. Campinas, agosto de 2015.


DEMOCRACIA, CONTROLE SOCIAL E DIREITOS HUMANOS

Por Francisca Pini e Célio Moraes



Participar politicamente significa, fundamentalmente, tomar parte nas decisões sobre políticas públicas. Consiste em formar opinião sobre uma decisão do Estado; em expressar, pública e livremente, essa opinião; e em vê-la levada em consideração. Trata-se de uma meta ainda a ser atingida, pois nenhuma sociedade possibilitou, até hoje, a plena participação política de todos os seus cidadãos (Plínio de Arruda Sampaio: 2005, p. 47).
       No contexto da redemocratização, conquistamos um novo ordenamento jurídico, que traz como centralidade a participação popular nos processos decisórios. Desse modo, nos anos 1990, no Brasil, inicia-se um período de conquista do ponto de vista jurídico para ampliação da participação social assegurados nos documentos da Constituição Federal, Lei Orgânica da Saúde (SUS), Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), e de um conjunto de princípios e diretrizes que colocam as políticas sociais como dever do estado e sua construção de forma articulada com a sociedade, por meio de representações da sociedade civil. Esta conquista se materializou, ao longo de duas décadas, de forma insatisfatória, em decorrência do enfraquecimento do Estado pela ofensiva neoliberal, que, de forma avassaladora, instaurou seu ideário da privatização e da redução do Estado na garantia de políticas sociais a todos os cidadãos.
      O cenário da década de 1990 exigiu profundas mudanças no interior dos movimentos sociais, bem como a convivência com novos atores na arena política. Diversas estratégias foram formuladas pelas lideranças e movimentos como parte da disputa política de alguns processos como: participação em Conselhos, assunção de cargos nos executivos, assessoria de parlamentares, a institucionalização de alguns Movimentos, atuação em redes, construção de agendas comuns e a correlação de forças, para assumir a condução política do processo, que têm feito parte de um novo momento político no campo das lutas sociais.
     Ao analisarmos a conjuntura da política brasileira, percebemos que há fragilidade do sistema político democrático. Dentre os vários motivos, citamos a qualidade da classe política que, em sua maioria, não tem compromisso com o bem comum, dificultando o fortalecimento dos aparelhos do Estado, cuja função é a de assegurar e garantir os direitos sociais, econômicos, políticos, ambientais e culturais a toda a sociedade.
       A estratégia para o enfreamento ao grande capital está centrada na disputa por projetos que demarquem a posição no plano político, a participação ativa e efetiva dos sujeitos no sentido de romper com a centralidade do poder, sempre decidida pelas cúpulas, conforme compreensão de Gramsci (filósofo, italiano, que morreu no Cárcere, em 1937). Para ele, o caminho e as formas dos instrumentos a serem utilizados para acessar o governo pressupunham uma relação de transparência educativa e transformadora das relações econômicas e sociais para alcançar a plena democracia. Essa construção romperia com os caminhos e os instrumentos adotados pela hegemonia burguesa.
     Conforme Marilena Chauí (2005, p. 24), há diferentes formas de “caracterizar a democracia ultrapassando a ideia de um regime político identificado à forma de governo, tomando-a como forma geral de uma sociedade”.
       Afirma a autora que uma sociedade é democrática quando institui algo mais profundo, que é condição do próprio regime político, ou seja, quando institui direitos, e que essa instituição é uma criação social, de tal maneira que a atividade democrática social se realiza como luta social e, politicamente, como um contra poder social que determina, dirige, controla, limita e modifica a ação estatal e o poder dos governantes.
      Fundada na noção de direitos, a democracia está apta a diferenciá-los de privilégios e carências. Um privilégio é, por definição, algo particular que não pode generalizar-se nem universaliza-se sem deixar de ser privilégio. Uma carência é uma falta também particular ou específica que desemboca numa demanda também particular ou específica, não conseguindo generalizar-se nem universalizar-se. Um direito, ao contrário de carências e privilégios, não é particular ou específico, mas geral e universal, seja porque é o mesmo e válido para todos os indivíduos, grupos e classes sociais, seja porque embora diferenciado é reconhecido por todos.
     Essa formulação nos permite compreender que a democracia transcende o direito ao voto, visto que isso não assegura à população participar ativamente nos processos decisórios de seu país. O processo de decisões políticas, desta maneira, deverá propiciar que todos tomem consciência de sua situação singular e coletiva, mobilizando os sujeitos para a luta contra a barbárie e em defesa do projeto de emancipação humana.
   Com base nos princípios da participação popular e da democracia participativa conquistamos um conjunto de leis e diretrizes que nos oferecem instrumentos para a luta social, mas é preciso observar que as leis, por si só, não bastam. É necessária ampla organização e articulação dos movimentos sociais e sindicais para exercer o controle social das questões públicas.
    Nesses 28 anos de Constituição Federal, conquistamos um conjunto de valores e princípios que buscam romper com a cultura de não ter direitos e pela afirmação do estado democrático de direito. Entretanto, a trincheira cultural é a maior barreira a ser vencida, tendo em vista que interferir nas estruturas da sociedade exige ação política e luta social permanente com o conjunto da sociedade.
    Por isso, há necessidade de relacionar democracia e Direitos Humanos nesta contraditória sociedade capitalista, para que possamos construir novos enfrentamentos, por meio das lutas sociais e para que os Direitos Humanos tenham incidência efetiva na vida pública do país. É preciso afirmar os Direitos Humanos inseridos no debate crítico acerca das múltiplas questões que envolvem a realidade social, como, por exemplo, reconhecer a diversidade cultural, de crenças e étnicas; direito à saúde, direito à educação pública, direito ao trabalho, direito de se expressar, enfim, tudo o que afeta a coletividade.
     O desafio posto à sociedade brasileira é o de construir uma sociedade democrática e popular, por meio de processos dialogados que contemplem o pluralismo sem perda da vontade e dos interesses da maioria.
    O Estado brasileiro, com os sucessivos escândalos de corrupção de alguns setores públicos, põe em discussão a questão ética dos órgãos públicos, somada ao distanciamento da socialização do poder em decorrência de um modo de governar que pouco possibilita a participação popular.
     Os desafios deste século XXI, dentre muitos, são: trazer o horizonte da esfera pública como caminho para emancipação política; romper com a alienação construída na sociedade, pois sem superação da alienação do trabalho e da exploração do trabalho não é possível discutir emancipação humana; e reacender a indignação nas pessoas para que consigam empreender lutas sociais. Tendo como base as condições objetivas dessa sociedade, pode-se lutar por garantias sociais e econômicas por meio do Estado e, progressivamente, conquistar mecanismos de acompanhamento, controle e deliberação de suas ações, rumo a outro projeto societário.
     Desse modo, o controle público é o conteúdo político do controle social, na medida em que as representações da sociedade civil ocupam os espaços políticos para disputar projetos societários e não de interesses privados e dos governos. Refletir, debater e formular políticas públicas tem a ver com o cotidiano e com a realidade social, as técnicas e os procedimentos são complementares na elaboração. Por isso que a maior parte dos órgãos públicos participativos são paritários; essa conquista faz parte do patrimônio político brasileiro.
      Os desafios dos espaços políticos de participação são muitos, mas vale destacar os que mais nos preocupam na atualidade: a) o sentido e o significado que atribuímos aos espaços de representação; b) como construímos posições nesses espaços; c) qual a interlocução desses espaços com a sociedade; d) como os espaços dialogam sistematicamente com o conjunto da sociedade; e) como a sociedade alimenta esses espaços e, por fim, f) qual a base de dados que existem nesses espaços, para a formulação de políticas públicas?
       A construção da cultura dos direitos nos exige mudanças de concepções, como aponta Paulo Freire:
(...) porque não discutir com os estudantes a realidade concreta que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é mais com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária ‘intimidade’ entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste descaso?” (1997, p. 33-34).
      As indagações de Paulo Freire comprovam que a mudança é possível e necessária. Desse modo, precisamos afirmar o sentido do controle social como espaço que rompe com a burocracia do sistema e luta para a ampliação da democracia e dos processos democráticos.
     É preciso reafirmar o nosso compromisso com a defesa intransigente dos Direitos Humanos e da democracia, com clareza política, rigorosidade metódica, participação social e ampliando, cada vez, mais os espaços de construção do poder popular para assegurar o controle do que é público e ampliar os direitos sociais, políticos, civis, econômicos e ambientais.

Referências
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Francisca Rodrigues de Oliveira Pini, Assistente Social/Educadora Popular, Mestre e Doutora em Políticas Sociais e Movimentos Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), desde 2006. Diretora Pedagógica do Instituto Paulo Freire (desde 2006), Integrante do Comitê Estadual dos Direitos Humanos do Estado de São Paulo, Sócia-fundadora do Centro de Direitos Humanos e de Defesa da Criança, Adolescente e Juventude (CEDHECA - Paulo Freire), filiada a Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-Graduação (ANDHEP) e atua nas áreas: Educação Popular em Direitos Humanos, Políticas Sociais e Movimentos Sociais.


Célio Vanderlei Moraes, psicólogo e mestre em Sociologia Política pela UFSC. Foi Coordenador Nacional do Centro de Formação de Educadores do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua. Ocupou o cargo de Conselheiro Municipal e Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescentes de Santa Catarina e do Conselho Nacional da Assistência Social. Atuou como Consultor PNUD/MDS para a Gestão do Trabalho e demais regulamentações atuais do SUAS. Atualmente assessora o Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, é educador do Instituto Paulo Freire / SP, atua em projetos nacionais da Pia Sociedade de São Paulo – PAULUS e é membro curador do Portal Social Soluções.

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